Para Karisme Enquanto Não Acontece Nada
Mas, o que é isso?
De repente, eu tento. Tente.
Tonto. Tanto entrocamento.
Eu muito à vontade
numa isolação irracional.
Com a certeza tesa
de que já não existe mais nada por acontecer.
Karisme, o que é isso?
Eu me vejo de repente roendo o seu pescoço.
É como se houvesse um osso e um dente único
canino
canhoto
que roi roi roi.
É dor, Karisme e eu me aparto da tristeza e do ódio,
mas acuso: doi.
É como se ninguém mais fosse.
É como se ninguém mais desse.
É como se ninguém morresse.
Rói, Karisme, temperamental e ausente.
Morde nos teus dentes minha ausência e sangre.
Embrenha, berre, sangue, alunação pungente.
Eu me dou inteiro: corta, é teu
— evolução na lama, aurore —
eu mato: entenda.
E vagarosamente me descolo de teu colo cálido
com a mansidão macia das serpentes.
Pisa, é teu.
É dor e doi, mas pisa.
Faz acontecer amor a mais,
amai, mas crede, crie.
Grite — endoideceu o dia.
Debrucei demais num desespero, acorda!
Vem, que eu faço ficar roxo,
nem que o dia se funda em maldição total,
nem que eu me gangrene todo na descoberta de teu ódio,
nem que eu me despedace e me esfacele no teu vômito,
nem que eu morra... mate e me olhe: crie!
São Paulo, 1973
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