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Marcos Resende Poemas

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Primeiro Contracanto Para Karisme Adormecida

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Karisme, Karisme,
não vacile, não cometa.
Não existe mais perigo em meu planeta, não.

Pulei estrelas e estradas,
vaguei viagens, vinhedos,
planei penhascos e andrômedas
e vinguei voar ligeiro,
pelo cheiro dos moluscos,
pela fome dos desertos.

Karisme, Karisme,
não respire, não rejeite,
não respeite o peito seu em polvorosa, não.

Rompi roupagens e panos,
rumei o meio dos medos,
desfiz o fio das brumas
e em algumas, renasci,
pelo cheiro dos crisântemos,
pela fome das sementes.

Cacei caçambas à-toa.
À tona então me voltei.
Verti ao sumo das águas,
várias vagas conheci,
pelo cheiro das anêmonas,
pela fome das mandrágoras.

Karisme, Karisme,
vamos ao campo, que não tarda o amadurecer das amapolas,
e as rolas nos primeiros passos, com os primeiros pássaros
passeiam pelas flores entreabertas.
Não custa. Acorde. Surja na manhã mañana.
Carece de você o orvalho, o vegetal, o tempo manhoso.
Acorde.
Esparramei você nos pólens dos gerânios, antes das chuvas.
Esparramei você nos pólens de gerânios escolhidos.
E permaneci na espreita, como em desespero, como em desenlace.

Fugi do fogo e da fúria,
furei o inferno de cera,
assim, refiz meu silêncio.
Expus espasmos e penas,
apenas pisei o pó.
Enlueceu na alameda
e na lenda luarou.
Karisme, cara, carinho.
Carência, crise, canhão

Karisme, carabina-cano-cal e tempestade.
Estrela e trilha
lagoa flácida de luz.
Enlueceu, enluejou
eu vago, vogo, volto e vou
e venho e sou:
sol esquartejado, submerso em suas mãos.

Os figos já se desprendem dos caules.
As romãs estilhaçadas estalam e se extrovertem,
enquanto seus bagos vermelhos perdem o viço.
Os últimos lenhadores desocupam. Desacampam.
E sonolento e lento lá se vai bem longe
o canto das mulheres que colheram o trigo.

Estrela entre as estrelas, venha ver o vale:
os figos já se desprendem dos galhos
e as fiandeiras se debruçam nos fusos.

A cotovia buliu nos pingentes de pedra.
A embarcação cursou os espinheiros confusos.
E tudo se arrumou em seu lugar de origem.

Venha, virgem, ver o sangue das clepsidras
desfeito em vinho, em vão,
em uva, em chuva,
em mel, em mirra,
na manhã mañana.

Venha, virgem, agora,
embora a relva não conserve a mesma seiva
e as madressilvas quase desfaleçam.
Venha, antes que desfaleça eu mesmo de amor,
pois, sua ausência embruteceu meu sono
pungente e insolúvel,
descrente e desnudo,
consciente de tudo,
consciente e contudo
carente de paz.

Varginha, 1972

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